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Como aplicar o novo incentivo à capitalização das empresas

By 11 Agosto, 2023Agosto 14th, 2023Sem categoria

Rui Araújo Correia

 

A Lei Orçamental de 2023 (e complementarmente, a Lei n.º 20/2023, de 17 de maio) introduziu um novo regime fiscal de incentivo à capitalização das empresas, permitindo deduzir ao lucro tributável sujeito a IRC uma percentagem dos “aumentos líquidos dos capitais próprios elegíveis”.

Com a entrada em vigor deste benefício termina a anterior RCCS – Remuneração Convencional do Capital Social e a DLRR – Dedução por lucros retidos e reinvestidos, embora, no caso da primeira, se mantenham as deduções pelo período remanescente (exercício do aumento de capital relevante e os cinco posteriores).

A transição entre estes dois benefícios motivou alguma controvérsia, mas a citada Lei 20/2023 veio esclarecer este aspeto e ainda clarificou a aplicabilidade do novo regime em 2023.

Assim, e em primeiro lugar, como funciona o incentivo à capitalização das empresas (ICE) previsto no artigo 43.º-D do EBF?

A dedução ao lucro tributável sujeito a IRC das entidades abrangidas será de 4,5%, ou 5% no caso das PME e empresas de pequena-média capitalização (Small Mid Cap), dos “aumentos líquidos dos capitais próprios elegíveis” apurados no próprio exercício e nos nove períodos de tributação anteriores. Esta regra inicia-se em 2023, pelo que um aumento de capital elegível este ano já contará para a dedução ao lucro tributável de 2023, procedendo-se nos nove anos seguintes ao somatório dos valores apurados em cada exercício desde 2023 para aferir do montante elegível em cada ano. Como este novo artigo entrou em vigor a 1 de janeiro de 2023, só em 2032 existirão nove períodos de tributação anteriores, mas o somatório efetuar-se-á anualmente com os anos decorridos desde 2023.

A dedução anual fica sujeita ao maior de dois limites, a saber: 2 milhões de euros, ou 30% do resultado antes de depreciações, amortizações, gastos de financiamento líquidos e impostos (EBITDA). No entanto, se se aplicar este último limite, o excedente é dedutível no apuramento do lucro tributável de um ou mais dos cinco períodos de tributação posteriores, após a dedução relativa a esse mesmo período, respeitando os mesmos limites anuais.

Entram para o cálculo do aumento de capital próprio os seguintes aportes de capital:

  1. As entradas realizadas em dinheiro no âmbito da constituição de sociedades ou do aumento do capital social da sociedade beneficiária;

  2. As entradas em espécie realizadas no âmbito de aumento do capital social que correspondam à conversão de créditos em capital;

  3. Os prémios de emissão de participações sociais;

  4. A aplicação dos lucros contabilísticos passíveis de distribuição, de acordo com a legislação comercial, em resultados transitados ou, diretamente, em reservas ou no aumento do capital.

Os “aumentos líquidos dos capitais próprios elegíveis” correspondem à diferença entre os aumentos acima elencados e, as saídas, em dinheiro ou em espécie, a favor dos titulares do capital, a título de redução do mesmo ou de partilha do património, e as distribuições de reservas ou resultados transitados. Quando a diferença apurada for negativa, considera-se zero para efeitos do somatório relevante.

Quanto ao regime transitório que regula a aplicabilidade do ICE e da RCCS, fica estipulado que os aumentos de capital com recurso aos lucros de 2022 podem beneficiar, em 2023, do ICE, exceto se a empresa utilizou em 2022 a dedução ao abrigo da RCCS (segundo este regime, desde que o aumento de capital tenha sido registado até à entrega da declaração de rendimentos M22 desse ano, será 2022 o 1º ano de dedução).

Analisando brevemente os dois regimes (a RCCS que vigorou até 31/12/2022 e o ICE que entrou em vigor a 1/1/2023), constata-se de imediato que a taxa de dedução ao lucro tributável é agora mais baixa, 4,5%, ou 5% nas PME e Small Mid Cap, contra 7% na RCCS, mas o período de dedução e o âmbito da base elegível são mais alargados no ICE. De facto, o novo regime estende-se ao longo de dez exercícios contra seis no anterior, o que anula a diferença de taxas no valor acumulado (45% contra 42%) na situação base, mas que quando se aplicar a majoração é ainda mais favorável (50% contra 42%). Por outro lado, o ICE introduz no conceito de aumento elegível do capital próprio a normal aplicação em reservas ou resultados transitados do lucro distribuível do exercício, o que alarga indiscutivelmente o seu efeito na determinação do lucro tributável em IRC. Saliente-se, no entanto, que o lucro contabilístico passível de distribuição de acordo com a legislação comercial, não corresponde à totalidade do resultado líquido após impostos, pois de acordo com o artigo 33.º do CSC, “Não podem ser distribuídos aos sócios os lucros do exercício que sejam necessários para cobrir prejuízos transitados ou para formar ou reconstituir reservas impostas pela lei ou pelo contrato de sociedade” nem “enquanto as despesas de constituição, de investigação e de desenvolvimento não estiverem completamente amortizadas, exceto se o montante das reservas livres e dos resultados transitados for, pelo menos, igual ao dessas despesas não amortizadas. Assim, só o excedente do que tiver de cobrir prejuízos transitados ou da parcela destinada a reserva legal poderá ser elegível para o benefício do ICE. Por fim, os limites do novo regime são menos expressivos que na RCCS, já que o limite absoluto de 2 milhões de euros é aplicado à dedução em si enquanto anteriormente vigorava para as entradas relevantes (base elegível para a determinação do benefício), muito embora se tenha introduzido a limitação alternativa do máximo de 30% do EBITDA (amenizada pela possibilidade de reporte do excedente nos cinco anos subsequentes).

Por forma a tornar mais compreensível o funcionamento deste incentivo à capitalização das empresas atente-se nos seguintes exemplos:

  1. PME que obteve um Resultado Líquido de 300.000 euros em 2022, aplicado em Reservas Legais (5%) e Reservas Livres pelo remanescente.

O benefício em 2023 corresponderá a 14.250 euros (4,5%+0,5% de 285.000 euros), a deduzir ao lucro tributável desse exercício. Não existindo saídas nem entradas relevantes nos períodos de 2024 a 2032, em todos esses anos a empresa poderá deduzir o mesmo montante no apuramento do lucro tributável em sede de IRC. Isto corresponde a uma dedução acumulada de 142.500 euros, que à taxa normal de IRC representa uma poupança de 29.925 euros.

Se a empresa tivesse optado pela RCCS e efetuasse um aumento de capital registado até à entrega da Modelo 22, teria deduzido em 2022 o montante de 19.950 euros e deduziria nos anos de 2023 a 2027 o mesmo montante anual. Em termos acumulados o benefício ascenderia a 119.700 euros, que à taxa normal de IRC representa uma poupança de 25.137 euros.

  1. PME que obtém Resultados Líquidos de 300.000, 350.000, 400.000, 450.000 e 500.000 euros, respetivamente em 2022, 2023, 2024, 2025 e 2026, aplicado em Reservas Legais (5%), distribuição de resultados, 100.000 euros e Reservas Livres pelo remanescente.

Ao longo de um período de 14 anos, os aumentos líquidos de capitais próprios verificados de 2023 a 2027 originam uma dedução acumulada de 700.000 euros, representando uma poupança de IRC de 147.000 euros. A tabela abaixo demonstra os cálculos efetuados.

Ano Res. Líq.N-1 Reserva Legal Dividendos Reservas Livres Base dedução Taxa ICE Dedução anual
2023 300,000 15,000 100,000 185,000 185,000 5% 9,250
2024 350,000 17,500 100,000 232,500 417,500 5% 20,875
2025 400,000 20,000 100,000 280,000 697,500 5% 34,875
2026 450,000 22,500 100,000 327,500 1,025,000 5% 51,250
2027 500,000 25,000 100,000 375,000 1,400,000 5% 70,000
2028 1,400,000 5% 70,000
2029 1,400,000 5% 70,000
2030 1,400,000 5% 70,000
2031 1,400,000 5% 70,000
2032 1,400,000 5% 70,000
2033 1,215,000 5% 60,750
2034 982,500 5% 49,125
2035 702,500 5% 35,125
2036 375,000 5% 18,750

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