Como manter um trabalhador motivado num mundo cada vez mais ambicioso? O que fazer para evitar a saída de um ativo promissor quando não se pode competir através do salário? Será o fator monetário o único capaz de motivar um trabalhador?
Os fundamentos da economia neoclássica remetem-nos para agentes racionais. Estes agentes, ao exercer a sua função de trabalhadores, não iriam aceitar trabalhar mais e colocar um esforço maior numa tarefa caso não fossem monetariamente recompensados por isso. Afinal de contas, tudo o que não levasse a esta conclusão seria um comportamento irracional e, como bem sabemos, essa é uma característica que o típico agente neoclássico não apresenta.
No entanto, devido ao trabalho de diversos autores noutros ramos da economia, principalmente no da comportamental (onde se destaca Richard Thaler, agraciado com o Prémio Nobel da Economia em 2017), tal premissa tem-se revelado pouco concisa. E se a apreciação dos trabalhadores por incentivos com valor monetário se continuará a revelar verdadeira, também é verdade que há muitos outros fatores que podem ter influência na felicidade do trabalhador e, consequentemente, no empenho que este coloca numa tarefa.
Um desses fatores é o reconhecimento sob a forma de prémios não monetários. Este reconhecimento, uma componente indubitavelmente social, relaciona-se com a importância que os trabalhadores, seres humanos e naturalmente longe de serem 100% racionais, dão ao facto de se sentirem apreciados pelos seus superiores. Este raciocínio, que não é novo, e que está, por exemplo, na origem da motivação para a doação de sangue ou para a entrega de medalhas nas organizações militares, apela ainda à sensibilidade do indivíduo para sentir que o empregador o vê enquanto pessoa e não apenas enquanto ativo.
Se olharmos para as tendências comportamentais dos últimos anos, também não será de estranhar esta preocupação das pessoas para com a sua imagem e para como os outros as veem. É fácil olhar para exemplos como o facto de, cada vez mais, os consumidores direcionarem as suas preferências para produtos socialmente responsáveis, uma vez que estes contribuem para uma melhor imagem pública dos seus compradores ou a crescente preocupação das empresas em parecerem socialmente responsáveis e estarem a par de todas as tendências que surgem nesse sentido. Mas facilmente se compreende o porquê…afinal de contas, essa boa imagem pública torna-se mais fácil de ser monetizada.
Também a transição desta tendência para o mundo empresarial não demorou muito e pode ser vista em praticamente todas as empresas. De acordo com um estudo baseado em dados pré-pandémicos (2019) do WorldatWord, 87% das empresas analisadas utilizavam pelo menos um programa de reconhecimento público, como por exemplo a distinção do empregado do mês ou o acesso a alguma oportunidade de desenvolvimento pessoal. De forma idêntica, já em 2007, Bloom e Van Reenem alertavam para este paradigma, ao desenvolver um estudo em que indicavam que 60% das empresas de manufatura por eles estudadas divulgavam e comparavam dados sobre as performances dos funcionários de forma pública, o que se transformava em ganhos para as ditas empresas, o que, uma vez mais remete para a importância que os funcionários dão ao reconhecimento que obtêm pelos seus empregadores.
Direcionamo-nos agora para um estudo empírico de Kube, Maréchal e Puppe, publicado na American Economic Association em 2012. Nesse estudo, os autores recrutaram trabalhadores para realizar uma tarefa, em troca de um salário fixo, o qual lhes foi previamente anunciado. No entanto, acabariam por receber também um pequeno bónus extra, que poderia aparecer sob duas formas diferentes: ou era dado em dinheiro ou sob a forma de uma garrafa térmica, sendo que ambos tinham exatamente o mesmo valor monetário. Adicionalmente, numa outra versão do experimento, os trabalhadores foram informados dessa mesma informação, ou seja, que o valor de mercado da garrafa térmica era exatamente igual ao valor do bónus monetário oferecido. Em ambas as versões, os trabalhadores que receberam a garrafa térmica apresentaram uma produtividade média significativamente superior aos que receberam o prémio monetário. Curioso foi também o facto de que, quando previamente questionados sobre se preferiam receber o prémio em dinheiro ou na forma de uma garrafa térmica, a grande maioria acabou por escolher o dinheiro. Assim, os resultados parecem apontar claramente para a ideia que, apesar de teoricamente preferirem receber incentivos monetários, quando confrontados com o efetivo recebimento do bónus, os trabalhadores dão mais importância a prémios que lhes percecionem a ideia de que houve tempo e esforço investido pela entidade empregadora. Não surpreende, portanto, que o recebimento destes prémios leve a que o próprio trabalhador queira ter uma atitude recíproca e, portanto, também ele invista mais tempo e esforço nas tarefas a realizar.
Estes resultados estão, portanto, congruentes com uma das ideias centrais da investigação de Robert Dur, que indica que empregadores mais compreensivos, altruístas e atenciosos conseguem oferecer mais facilmente salários menores aos seus trabalhadores, uma vez que essas suas características lhes permitem construir uma relação melhor com eles e “induzi-los” a trabalhar mais arduamente em comparação com trabalhadores cujo salário seja superior, mas onde os altos quadros não lhes deem o mesmo reconhecimento.
Com o objetivo de reforçar a análise desta questão, foi desenvolvido um pequeno estudo com uma amostra de 370 estudantes das diversas faculdades da Universidade do Porto. Para isso, foi proposto aos estudantes que respondessem a um questionário de quinze perguntas de cultura geral, onde eram inquiridos sobre os mais variados temas, tendo este questionário quatro versões, que foram distribuídas aleatoriamente pelos participantes: a primeira, onde o estudante apenas era incentivado a responder ao questionário; a segunda, onde o estudante tinha acesso a um pequeno vídeo com um agradecimento pela sua participação; a terceira, onde, para além do agradecimento anterior, o estudante era ainda informado de que, caso obtivesse a melhor classificação no questionário, teria direito a um prémio de natureza não monetária; e, finalmente, a quarta, onde o estudante poderia escolher esse prémio entre um conjunto limitado de opções, que incluíam um poema, uma fotografia, um diploma ou um texto personalizados.
O primeiro dos grupos experimentais, isto é, aquele onde o estudante apenas tinha acesso a um pequeno vídeo de agradecimento, constituiu uma espécie de meio-termo entre o grupo de controlo e os dois verdadeiros grupos experimentais, visto que, nesta versão, os estudantes não estavam efetivamente a receber nenhum prémio pela sua produtividade, já que todos os estudantes alocados a esta versão, também tinham acesso ao mesmo vídeo. Assim, este “prémio” iria perder as suas características de exclusividade.
A tarefa passava, então, por desafiar os estudantes a utilizar algum mecanismo de pesquisa, como, por exemplo, um motor de busca para obter as respostas às perguntas apresentadas. Estas perguntas, no entanto, iam aumentando o seu grau de dificuldade à medida que o estudante avançava no questionário. De forma a garantir que as perguntas apresentadas tinham efetivamente um grau de dificuldade maior e que, assim sendo, o estudante teria que procurar a resposta às mesmas com um maior cuidado, fez-se uma simulação através da cópia das perguntas para um motor de busca, de forma a posicionar perguntas cuja resposta era mais difícil de obter com uma pontuação maior.
Os resultados apontam para uma evidente correlação entre o acesso ao prémio e o esforço do estudante na resposta ao questionário, tal como evidenciado pelo maior número de respostas corretas em todas as três versões que representavam os grupos experimentais, em comparação com a versão de controlo. Também as transcrições destes resultados para um modelo econométrico complementam a viabilidade da análise, apresentando este modelo significância estatística em dois dos grupos experimentais (precisamente naqueles que apresentavam a possibilidade de recebimento efetivo de um prémio).
A mera apresentação do vídeo de agradecimento aumentou a produtividade dos estudantes em 7% em relação ao número de respostas corretas, quando comparado com o grupo de controlo. Já na versão em que os estudantes sabiam de antemão que as melhores performances teriam direito a um prémio, a produtividade apresentou-se 24% superior ao grupo de controlo. Por fim, quando apresentados às possibilidades de escolha do prémio, este aumento diminuiu para 11% em termos de respostas corretas. Esta diferença significativa entre as duas versões onde se apresentava a possibilidade de recebimento de um prémio poderá justificar-se pela ausência da apresentação de exemplos visíveis das opções expostas ou mesmo pela falta de interesse nas alternativas apresentadas.
Ainda assim, os incrementos visíveis nos três grupos experimentais, reforçados pelo facto de nenhuma das três versões apresentar um prémio de natureza monetária envolvido, parecem ser explicados pela oferta de um maior reconhecimento.
O estudo revelou ainda outras conclusões interessantes, nomeadamente aquando da introdução de mais variáveis no modelo e especificamente de uma que versava sobre a existência ou não de participações prévias em qualquer tipo de ações de voluntariado. Denotou-se que os estudantes que responderam afirmativamente, aumentaram significativamente a sua produtividade quando confrontados com a existência de um prémio exclusivo, em contraste com o acesso a um vídeo de agradecimento genérico. Estes resultados apontam claramente para um desejo de reconhecimento por parte destes estudantes, revelando que até mesmo aqueles que parecem ser mais altruístas têm esse desejo de serem reconhecidos.
Por fim, apenas uma nota em jeito de reforço, que o objetivo deste artigo não é dizer que todos os aumentos de salário podem ser substituídos por reconhecimento. Os trabalhadores continuarão a gostar e a precisar de incentivos monetários para se sentirem valorizados no trabalho. Contudo, por vezes, ao invés de se oferecer um pequeno bónus monetário (e reforce-se a palavra “pequeno”), talvez seja mais eficaz oferecer uma alternativa mais criativa e personalizada para o trabalhador. Gnnezy e Rustichini debruçaram muita da sua investigação sobre este assunto e concluíram precisamente que, apesar de altas compensações monetárias conduzirem a maiores esforços por parte do trabalhador, a história muda de figura quando a compensação é percebida por este como sendo baixa. Neste caso, a oferta de uma baixa compensação monetária conduzirá a piores resultados do que a oferta de presentes que percecionem ao trabalhador que o empregador dedicou tempo e esforço a pensar nele. No limite, a oferta de uma baixa compensação monetária poderá mesmo ser menos eficaz do que a ausência total de qualquer recompensa.
No final, fica a ideia que, numa altura em que a competição é cada vez maior, as empresas devem investir no reconhecimento dos seus trabalhadores, de forma a criarem vantagens competitivas importantíssimas face aos seus rivais, nomeadamente porque os seus trabalhadores estarão mais motivados para trabalhar, terão menos probabilidade de desistir do trabalho e terão ainda uma maior probabilidade de desenvolver uma conexão social com a empresa e seus órgãos. Para concluir e aproveitando para fazer uma alusão à época de festividades que se encontra a decorrer, em que inevitavelmente tudo nos remete para a importância das emoções, aconselha-se a todos os empregadores que alarguem esses sentimentos aos seus trabalhadores. Às vezes, é tão simples como perguntar-lhes como correu o dia ou oferecer-lhes uma lembrança cuidada. São gestos que nada custam e que podem render muito. Afinal de contas, quanto mais o trabalhador sentir o esforço do empregador, mais se esforçará por retribuí-lo.